Críticas

B.E.C.O. | Grupo Zumb.boys (CCSP Semanas de Dança)

Embrião de um projeto artístico de sucesso, “B.E.C.O.” encerra as comemorações dos 10 anos de pesquisa cênica do Grupo Zumb.boys no Semanas de Dança do Centro Cultural São Paulo.

Primeiro dos trabalhos do Grupo Zumb.boys que identifica a proposta de misturar o breaking com a dança contemporânea, “B.E.C.O.” foi criada em 2014 como um espetáculo voltado à questão da ocupação da cidade. Apresentada como parte das comemorações dos 10 anos de pesquisa cênica da companhia, dentro do CCSP Semanas de Dança 2017 do Centro Cultural São Paulo, é uma oportunidade para rever as origens do trabalho do grupo paulistano, e o longo caminho que percorreram desde então.

Uma grande mudança para a apresentação nesse evento foi a inclusão da música ao vivo, com a participação da Banda BOND BLACK, colocada junto dos intérpretes no palco. Cria-se um evento — celebrativo até para o público, especialmente por ser o encerramento das apresentações dessa comemoração no CCSP —, mas com a banda em cena o palco da Sala Adoniram Barbosa ficou pequeno, e o elenco espremido.

A proposta coreográfica de “B.E.C.O.” é descontrutiva, mostrando as partes e os elementos das técnicas e do movimento dos b-boys. A estrutura, referenciando essa forma de dança, abre um espaço para o improviso, mas é realmente naquelas passagens em que vemos a coreografia articulada e em grupo que melhor se vislumbra o que vem sendo desenvolvido desde então nos trabalhos da companhia.

São recorrentes as cenas cômicas, trabalhadas pelo situacional e pelo desajuste, em ocasiões da vida cotidiana, usando imagens como a de uma fila, ou a de alguém tentando achar sinal para a antena do rádio. A comédia física é bem feita, só não é especialmente desenvolvida, atendo-se ao simplista. Quando trabalhada nessa sequência quase solta de cenas, acaba deixando em seu caminho algumas passagens que não se encaixam no todo, o que resulta na impressão de uma coletânea de momentos, mais do que de uma estrutura dramatúrgica concisa.

Há outras insistências, como um bailarino que sempre aparece sozinho em cena, sem se articular com os demais. Aqui, uma reflexão interessante sobre a questão da individualidade (e individuação) da realização desse estilo de dança, que frequentemente coloca os intérpretes em situações de exibição individual. É com a influência da pesquisa contemporânea que o grupo, em obras futuras, vai romper com essa constante individuação, investindo em interessantes articulações de conjuntos.

A questão do trabalho em solos só não faz o palco parecer excessivamente vazio porque, como mencionado, ele está reduzido, com a banda tomando parte considerável dele. Para além dessa questão, um outro elemento técnico é problemático: a iluminação que, talvez por um problema no planejamento do mapa, talvez por sua adequação ao espaço, funciona mal com a obra. Não há ambientação, ou um projeto de luz perceptível, e a obra vai sendo iluminada quase que como ao acaso, o que é uma pena para os conteúdos apresentados pelo grupo.

Ainda dentro das dificuldades que podem ser influenciadas pelo espaço, o predomínio de coreografias no chão faz a obra difícil de se ver naquela sala, que tem uma plateia realmente baixa — mas, ai, algo para além da criação da obra. Independentemente dos pequenos problemas que possam ser apontadas com essa realização, existe aqui algo realmente digno de elogio. Trata-se do projeto artístico dos Zumb.boys. É natural que essa, sendo a primeira das obras dessa proposta, mostre os sinais de um começo de trabalhos.

O admirável é, numa situação como essa mostra de repertório, perceber o quanto a companhia evoluiu, e o quão rapidamente isso se deu. “Dança Por Correio” e “O Que Se Rouba” — que também foram apresentadas em outros dias — são claros exemplos do sucesso do trabalho técnico e da proposta artística desenvolvida sob a direção de Márcio Greyk. Não só pela sua capacidade de articulação de referências distintas de dança, mas por uma qualidade notável de pensamento, de criação, e de interpretação — que se interessam por seu público e o cativam, em retorno recebendo sua admiração e reconhecimento. E nesse “B.E.C.O.” encontramos o embrião disso tudo.

 

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