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Coluna de
08 de janeiro, 2023

Retrospectiva 2022

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Como foi a dança em 2022? Tem 7 pistas nessa retrospectiva!

2022 foi um ano de muita dança, muita inconstância, muita ansiedade, alguns medos e uns bons motivos pra comemorar. Na minha retrospectiva, 7 pontos pra refletir sobre o que a dança tem sido, e pra onde ela vai.

 

Excesso de trabalho, falta de tempo

Esse foi um ano de reestabelecimento da programação intensa, com espaços retomando a quantidade de programação que estávamos acostumados a ver antes da pandemia. Sofremos um pouco mais com articular isso tudo nas agendas e na vida pós-pandêmica. Não importa onde, a tônica de 2022 parece que foi “excesso de trabalho, falta de tempo”. Na dança também. Nessas situações, a gente acaba perdendo muita coisa: não cabe, não dá conta, não tem como. Muito mais foi sublinhado pelo “é o que dá pra fazer, mas não é o que era pra ser”. De certa forma, continuamos nos erguendo, mesmo que às vezes um pouco arrastados.

 

Comunicação capenga

A multiplicação dos trabalhos multiplica seus problemas. Antes da pandemia, as temporadas de dança caminhavam pra uma mudança interessante, com formatos mais diluídos e apresentações em mais espaços. A competição pelas pautas, e a desova de tanto do que só agora pode ser produzido talvez tenha reduzido as temporadas, o que sempre complica a possibilidade de acompanhamento. A maior diminuição que me incomodou esse ano foi a de comunicação. Precarizada, em cima da hora, no desespero,  ou simplesmente inexistente, tem dança que nem ficamos sabendo que aconteceu. É uma pauta eterna da dança, e é um problema contínuo que comentamos a cada reunião da APCA: se nem os críticos estão sabendo onde tem dança, o problema é grande. Mas temos, como sempre, deliciosas excessões. Algumas assessorias de imprensa, mesmo atropeladas pelo excesso de trabalho desse ano, se mantêm, firmes e fortes, na divulgação da dança. A esses parceiros e parceiras queridos sou imensamente grato. Pra poder ver o tanto de dança que eu gosto de ver, é preciso de uma produção intensa, mas é preciso de uma comunicação igualmente intensa.

 

Dança precisa de formação

É um tópico insistente, e continua fundamental: dança precisa de formação. O humano se mexe, o humano dança. Assim como fala, rabisca e escreve. Entre fazer uma coisa, e fazer uma coisa enquanto arte — pro contato com o outro, pra apreciação e comunicação com o público — existe um universo a ser preenchido. E ele não é preenchido pelo gênio, pela iluminação divina, pela inspiração incontornável; mas pela prática, pelo estudo, pelo preparo, pela formação. Ter muita dança não é o mesmo que ter muita dança bem feita. Ter mais gente na dança não é o mesmo que ter mais gente bem preparada na dança. A falta de regulamentação do ensino de dança carrega desde sempre essa dificuldade. A falta do investimento em tempo de formação é um problema, mas a falta de qualidade na formação é outro ainda maior. Apesar dos percalços, temos visto projetos notáveis de formação, e o surgimento de Companhias Jovens — como a já reconhecida Cia Jovem de Dança de Jundiaí, mas também a mais recente Cia Jovem Ballet Paraisópolis, e a ideia de uma Cia Jovem da EDASP — que identificam a preocupação real com a dança enquanto campo profissional. Sem formação, sem preparo, a arte é só desejo. Pra se abrir pro mundo, ela precisa de mais que isso.

 

Dança temática

Dois foram os temas que dominaram a dança de 2022. O primeiro e maior deles, a Semana de 22, em seu centenário. O berço do modernismo da elite paulista foi, de forma extremamente previsível, ordenhado até não ter mais o que dar, e pela dança também, mesmo que a dança tenha sido uma figura mínima na ocasião celebrada. Parece que tudo virou motivo pra referência a 22 — tudo e nada… De autores modernistas a textos modernistas, passamos até pelo espírito modernista, e pela imaginação do que seria o modernismo se ele não fosse o que foi. A maioria dos resultados é bobagem e vai ficar presa na efeméride. Algumas realizações têm interesse enquanto dança, e essas se sustentam fora de situações de celebração. É o caso do trabalho de Miriam Druwe para a São Paulo Companhia de Dança, mas também do ciclo de Solos Para Villa-Lobos, realizado pela Oficina Cultural Oswald e Andrade. O modernismo é problemático e limitado, e se ele é digno de homenagem ainda é uma questão em aberto, mas trabalhos como esses se preocupam com mais do que a pauta óbvia, mais do que a mera homenagem, e mais do que a simples ilustração. Na outra ponta do ano, São Paulo foi inundada por produções de Quebra-Nozes. Talvez tenhamos chegado a um marco no propósito — questionável — de imitar a tradição estadunidense, e esse momento vem com trabalhos e propostas interessantes, mas também com o fadiga do excesso. Pros próximos anos, a expectativa que o excesso de nozes não se torne overdose, nem alergia.

 

Retorno triunfal, mas com peso nos pés

Um ponto que eu não poderia ignorar, porque tenho levantado como problema desde 2019, é a situação do Balé da Cidade. Artística e esteticamente, saímos do buraco: em 2022 a companhia produziu mais e dançou mais do que nos três anos anteriores juntos. Melhor ainda, produziu e dançou mais coisas relevantes. A direção de Cassi Abranches levantou o BCSP do poço. Administrativamente, a crise do Theatro Municipal e a infelicidade de suas gestões e escândalos que parecem não ter fim, continuam não só como uma sombra, mas como um peso nos pés dos Corpos Estáveis, atrapalhando sua grandiosidade. O Balé da Cidade continua sem sede, ensaiando em espaço particular (espaço maravilhoso, diga-se, porque a Company Dance Center é um luxo, mas é emprestado), porque se passou mais um ano em que as gestões do TMSP foram incapazes de finalizar a obra da Praça das Artes, que continua basicamente como estava em 2017. Os orçamentos reduzidos (para a dança, lógico, as óperas e a gestão do Theatro têm dinheiro pra vários excessos), têm exigido malabarismos e colaborações, que foram muito bem enfrentados pela equipe BCSP, e carregam bons resultados, mas que poderiam e deveriam ser ainda mais altos. Falta tirar esse peso dos pés pro Balé da Cidade poder dançar de fato com sua potência toda.

 

Perdas e Ganhos

Às vezes fica uma impressão de que a arte vive sob ameaça. A gente para pra pensar e saltam exemplos de projetos e espaços que acabaram ou quase acabaram, que perigam acabar. Claro que também sempre têm coisas novas, começando, e precisamos reconhecer e agradecer pelos novos começos, mesmo quando turbulentos. É assim com a São Paulo Escola de Dança: que bom termos mais uma escola pública de dança! Tem os espaços que dão a volta por cima e se preenchem de arte de um jeito ímpar, como a Oficina Cultural Oswald de Andrade, digna de reconhecimento por sua programação deliciosamente intensa em 2022. Esse ano perdemos (mais) grandes artistas, mas perdemos um espaço notável: o Teatro Alfa. Eu tenho dito que a Temporada de Dança do Alfa é o Carlton Dance da minha geração. Foi. Esses dois fenômenos emanam a energia da descoberta, do encontro, da apresentação. Se estabeleceram como faróis, trazendo mais luz pras possibilidades da nossa dança, e mais possibilidades pro público de São Paulo. O diferencial é que a Temporada seguiu por 19 anos, e se tornou uma ocasião emblemática de programação e continuidade. O encerramento das atividades do Teatro, decorrente da sua venda, não encerra a nossa esperança pela Temporada. Mas sem dúvida perdemos algo aqui. Faço uma pausa em silêncio pelo encerramento desse ciclo, agradecido por tudo que ele me trouxe. Mas esperançoso dos novos ciclos que virão. Esses últimos anos reafirmaram a nossa força de continuidade e de superação. A dança continua. A Temporada também precisa continuar.

 

O que precisa ser lembrado

Com tudo o que vai se criando e tudo o que vai desaparecendo, nunca foi tão evidente a importância da história e da memória da dança. Se construímos em terrenos movediços, se fazemos a vida pelo efêmero, é ainda mais importante registrar, preservar, conservar, guardar e lembrar. Essa é a missão de quem trabalha com história, e de quem trabalha com memória. Essa é a missão de colegas pesquisadores com quem aprendo tanto, e de parceiros como o Portal MUD. E é a minha também. Em 2022 tive o privilégio de ser confiado à missão de registrar a história da Companhia de Danças de Diadema, que celebrou seus 27 anos de atividades. Todo o processo, que resulta em um livro e um banco de dados, chama a atenção para os detalhes da memória. As tantas horas de entrevistas e conversas, os meses navegando os acervos, mostram que mesmo que a gente fale muito, ainda tem muito mais a descobrir. Nessa companhia, entre esses artistas, mas entre tantas e tantos outros, que também precisam nos contar suas histórias. Pra esse 2023 que se inicia, deixo votos de que a gente se preocupe mais com lembrar da dança que já foi feita.

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